Motores estão menores e melhores - saiba mais!



Blocos recebem aprimoramentos e novos materiais para melhorar rendimento e potência


Houve um tempo em que um motor 1.8 gerava 96 cv. Uma potência surpreendente para a época. E nem trata-se de uma época tão longínqua assim. Esse era o número de cavalos-vapor do Chevrolet Monza 1.8 movido a etanol na segunda metade dos anos 80. Menos de 25 anos depois, essa potência é superada por propulsores de menor litragem, como o 1.4 Econo.Flex do Agile, para não sair do universo da General Motors. Prova irrefutável e numérica de que os motores de automóveis evoluíram no mesmo ritmo que os próprios veículos. Novas tecnologias e uso de materiais mais nobres tornaram não só essa multiplicação de números possível, como também propulsores mais leves, eficientes e menos poluentes.

                Afinal, os propulsores 1.0 ultrapassaram a barreira dos 70 cv, mais de 40% superior que o primeiro “popular”, o Uno Mille dos anos 90, com seus singelos 48 cv. Uma evolução com a ajuda do advento do gerenciamento eletro-eletrônico. “Os sistemas de injeção eletrônica melhoraram o controle da mistura ar/combustível em detrimento do que acontecia com os carburados”, destaca Clayton Zabeu , engenheiro membro da SAE Brasil ­ Sociedade dos Engenheiros da Mobilidade. “Com novos softwares se consegue manter o motor mais tempo na melhor faixa de rendimento”, faz coro Roberto Yano, gerente de Engenharia de Produto da General Motors.

                A maior eficiência na relação ar/combustível dentro da câmara de combustão é a grande obsessão das engenharias automotivas. É o chamado rendimento térmico do motor, ou seja, a capacidade que ele tem de queimar essa mistura. Quanto maior a eficiência, ou seja, o rendimento térmico, melhor o motor vai queimar o combustível. “Quanto mais mistura colocar, maior probabilidade de desenvolver maior potência”, explica João Irineu Medeiros, diretor de engenharia de produto da FPT, empresa de motores do Grupo Fiat.

                Há a tal busca por misturas mais pobres. Para se ganhar em eficiência e, consequentemente, em emissões. A chamada mistura rica é quando sobe a proporção de combustível em relação ao ar na câmara de combustão. Muito comum nos carros antigos, quando não havia normas de emissões, esta “prática” permitia um aumento de potência, mas originava uma sobra e desperdício de combustível ­ ou seja, também não havia preocupação com economia, pois a gasolina era usada para resfriar a câmara e jogada fora. Hoje, o que se busca é a chamada mistura estequiométrica, ou a mais pobre possível. “Desta forma e com variação da ignição, adiantando ou atrasando, se consegue emissões e consumos menores com a mesma performance. É uma equação difícil, com uma tecnologia de controle da queima do motor muito sensível, mas é possível”, ressalta Henry Joseph, diretor da Associação de Engenharia Automotiva  ­ AEA.

                Essa “filosofia” é o que “justifica” a adoção cada vez mais comum da injeção direta ­ pelo menos, por enquanto, em modelos a gasolina na Europa. O combustível ingressa diretamente na câmara sem “intermediários”, o que permite uma mistura ainda mais pobre em um processo chamado de queima extratificada. Segundo os engenheiros, é como se fosse uma queima por “camadas”, onde o combustível é introduzido e queimado em um único ciclo. “Em um sistema de injeção convencional, o corpo da borboleta e o ar levam esse combustível injetado, gerando um turbilhonamento que leva à câmara. Na injeção direta, esse combustível já entra turbilhonado na câmara”, compara o engenheiro Alfredo Guedes, supervisor de relações institucionais da Honda.

                Mas em um segmento marcado por queixas, é claro que sobra para a injeção direta o rótulo de ser um processo caro e complexo. Da mesma forma que o comando variável de válvulas era chamado, mas hoje já pode ser encontrado em sedãs médios e até alguns compactos premium do mercado brasileiro, como o Honda Fit. O sistema ajusta o tempo de abertura das válvulas de admissão para obter sempre a melhor proporção ar/combustível, o que melhora o rendimento em todos os regimes. “O melhor desenho para comando de válvulas para baixa pode não ser o melhor para alta rotação. No sistema variável as aberturas e fechamentos são diferentes em alto e baixo giros”, enaltece Henry, da AEA. “Com isso, se consegue bom torque em baixa e potência elevada em alta”, completa Roberto, da GM.

                Mas a geometria da própria câmara de combustão também tornou os motores mais eficientes. Desenhos mais compactos buscam aprimorar a termodinâmica. Além disso, novos materiais dos componentes da unidade de força também geraram ganhos expressivos. A começar pelo peso mais leve dos conjuntos com a adoção de ligas mais nobres e alumínio. “Se obtém uma dissipação de calor mais eficiente, o que ajuda o motor a atingir a temperatura ideal de funcionamento mais rapidamente”, diz Alfredo, da Honda. O uso de materiais e peças mais modernos também ajudou ­ pistão, anéis, válvulas, eixo comando, entre outros. “Os materiais e processos de fabricação evoluíram e estão mais controlados. Antigamente, as peças eram mais largas e frouxas e ocorria maior atrito”, recorda Clayton, da SAE. “É possível fazer um coletor de aspiração novo. São vários os pontos que podemos atuar para melhorar rendimento”, defende João Irineu, da FPT.

Instantâneas



# A linha E.torQ da FPT é feita na antiga fábrica da Tritec ­ joint venture entre BMW e Chrysler ­ no Paraná. Mas, segundo a fabricante italiana, o propulsor original teve 70% do seu desenho refeito para equipar os modelos da Fiat.

# O sedã médio-grande Honda Accord possui um sistema variável de abertura e fechamento válvulas que promove o desligamento de três dos seis cilindros do motor de acordo com a necessidade de condução.

# Os motores modernos utilizam a chamada biela fraturada: a peça é fundida e depois quebrada para se encaixar perfeitamente ao pistão.

# Uma das medidas para melhorar a eficiência dos motores foi eliminar correias e polias e adotar correias únicas integradas.


Mais ou menos volume

                Uma das alternativas para otimizar a potência do motor é o aumento da capacidade volumétrica de um mesmo bloco. Ou seja, a litragem do propulsor é elevada para se obter maior desempenho. O que é comum no mercado. A linha Fire Evo da Fiat tem 1.0 e 1.4, enquanto a nova gama E.torQ tem variações 1.6 e 1.8, ambas com 16 válvulas. O bloco Família II 1.8 da GM que serviu ao Monza já foi 2.2 e 2.4, mas atualmente só resistiu o 2.0. “O aumento da cilindrada é uma opção de acordo com a quantidade de torque que precisa. Quanto maior cilindrada, maior o torque e maior o motor. Mas o aumento dessa litragem depende do projeto original”, explica João Irineu, da FPT.

                O aumento da litragem implica em uma série de mexidas no bloco. A mais comum é a modificação no curso do pistão, a distância que ele percorre para subir e descer, e nos cabeçotes. “O aumento gera principalmente mais torque a menores rotações para motores menores”, defende Roberto, da General Motors. O que não significa um processo mais simplificado. Segundo os engenheiros, a mudança da capacidade volumétrica implica em emissões mais pobres. “Cada cm³ que aumenta o motor encarece muito no tratamento dos gases gerados, o que pede alterações no sistema de catalisador, no sensor de oxigênio, entre outros”, ressalta Alfredo Guedes, da Honda.

                Neste panorama e com leis de emissões cada vez mais rígidas, a tendência é justamente o inverso. Ou seja, diminuição de litragens e introdução de turbocompressores e sistemas de injeção direta. É o chamado “downsizing”, já aplicado largamente na Europa. Em um motor menor, para oferecer a mesma potência de uma litragem superior seria preciso abrir mais as borboletas do conjunto. Só que com a borboleta toda aberta, a potência pode cair para metade do original. “É neste ponto onde entra a sobrealimentação, ou turbo, ao forçar mais ar para dentro do cilindro”, esclarece Clayton, da SAE Brasil.